Pela primeira vez, dirigi nos EUA com carro alugado da Avis via Mobility - Crédito: Natalie Soares

Road trip no Sul dos EUA: três mulheres e milhares de quilômetros rodados

por: Sylvia Barreto
12 de outubro 2022

Eu já havia feito algumas road trips pelos EUA. Porém, a última foi cheia de descobertas, superações e surpresas. Viajei de carro com duas amigas, Natalie Soares e Natalia Manczyk,  por cerca de 3.000 quilômetros em 12 dias sendo que eu nunca tinha dirigido pelo país, sempre estava acompanhada por alguém que assumia a direção. Dessa vez, foi diferente e confesso que estava com medo.

O roteiro da road trip no Sul do EUA: Nos encontramos em  Atlanta, na Geórgia, e pegamos um carro alugado. Ficamos duas noites na cidade e partimos para Nashville, no Tennessee, para mais duas noites.

Depois, nosso destino foi o Alabama. Começamos com uma parada rápida em Scottsboro e logo fomos para Hunstville, onde dormimos uma noite. O destino seguinte foi Birmingham para mais uma noite. Saímos de lá e demos uma passada rápida em Selma. Seguimos para Montgomery para mais uma noite e, por fim, dormimos em Mobile para no dia seguinte desbravarmos um novo Estado.

Passamos duas noites na animada e emblemática New Orleans, na Louisiana, e, de lá, seguimos para Tallahassee, capital da Flórida. Só paramos para dormir mesmo e tomar fôlego para continuar a viagem até Orlando, onde entregamos o carro quando chegamos porque íamos participar do maior evento de turismo dos EUA, a IPW.

Saímos as três dirigindo por cinco Estados do Sul dos EUA

Aproveito para, antes de continuar, pedir licença para escrever esse texto em primeira pessoa, como já deve ter percebido. Como este é um site jornalístico, redijo as matérias sempre em terceira pessoa. Apenas na seção “Palpites da editora” os artigos são pessoais, mas, desta vez, esse texto de viagem será extremamente pessoal e com a imparcialidade completamente atingida. Por isso, aviso no começo.

Quero avisar também para quem tiver maior interesse nos destinos em si que veja as matérias sobre cada um que publicarei no site e os vídeos que estão no YouTube. Vou deixar o link de tudo no final do texto conforme cada material for colocado no ar. No Instagram do Viajar é Simples também tem bastante conteúdo e, se você ainda não conhece, dá uma fuçada lá.

Neste texto que está lendo, terá minhas impressões de cada lugar e de uma viagem de carro pelos EUA feita apenas por mulheres, então, o tema da segurança será abordado. Ainda em 2022, causa admiração que três mulheres sozinhas saíam viajando por aí sem homem. Infelizmente, é assim. E, depende de nós fazer a nossa parte para mudar isso, espero que essas linhas contribuam para a mudança e te inspire.

No aeroporto de Atlanta esperando o shuttle para ir para área das locadoras – Crédito: Sylvia Barreto

O voo e a entrada nos EUA
Uma das amigas que me acompanha nessa viagem é a Natalie Soares, publicitária e fundadora do blog Sundaycooks, só para apresentá-la rapidamente por aqui. Nós saímos juntas do Brasil no mesmo voo da Delta. Sim, essa é a melhor companhia quando você quer voar de São Paulo para Atlanta, na Geórgia. O voo é direto e dura pouco menos de 10 horas. Aliás, a cidade dos EUA é um hub da companhia aérea, isso quer dizer que ela concentra vários voos saindo do Hartsfield-Jackson Atlanta International Airport e é algo importante também para suas conexões para outros destinos.

Após o voo tranquilo, foi hora de passar na imigração. No Brasil mesmo pediram meu comprovante de vacinação, então, quando cheguei em Atlanta, só mostrei meu passaporte, perguntaram até quando eu ficaria e, pronto, aprovada. É assim com todo mundo? Não necessariamente, essa foi a minha experiência, o importante é que você tenha todos seus comprovantes de passagem e hospedagem, não minta e tenha meios de se manter nos EUA pelo tempo que ficará por lá.
Natalie passou em outro guichê, por isso, nos perdemos. Fui pegar minha mala e fiquei com cara de boba procurando minha amiga. Não faça isso. Como costumo viajar sozinha ou com meu marido, chego, pego minha mala e saio da área das bagagens. Dessa vez, fiquei lá procurando minha amiga e uma policial me parou e pediu para eu abrir a mala.

Reservamos o carro pela Mobility e a locadora escolhida foi a Avis – Crédito: Sylvia Barreto

Claro que eu fiquei com medo dela implicar comigo, estava sozinha, nunca tinha passado por isso, perdi minha amiga, a outra vinha da Polônia e viajaríamos por três semanas pelo país. A mulher me faz várias perguntas e revirou minha mala. Respondi calmamente, falei que estava nervosa porque seria minha primeira vez a dirigir nos EUA porque era sempre meu marido quem dirigia e fui sincera. E, também quis mostrar que eu estava acostumada a viajar para lá e que eu tinha um motivo para voltar ao Brasil, o marido, pode parecer bobagem, mas é legal mostrar laços com seu país de origem quando é turista. Quando ela viu que só tinha mesmo umas 50 peças de roupas na minha mala, me liberou.

Ufa! Fiquei esperando a Natalie tensa, ela sumiu. Mandei mensagem e me contou que parou para fazer um teste voluntário de covid-19 para ajudar em uma pesquisa. Nessa viagem, eu estava usando pela primeira vez nos EUA meu pacote Vivo Travel e, se quiser saber mais sobre o serviço, clica aqui que tem conteúdo no Instagram sobre ele.

Encontrei Natalie e partimos para a segunda aventura dessa viagem que mal havia começado: pegar o carro.

Primeiras horas com o carro alugado
A primeira vez que aluguei carro nos EUA deve fazer mais de dez anos e estava com a família de uma amiga. Eles não falavam inglês, eu meio que cuidei de tudo, só que não dirigi. Ótimo, me livrei. Depois, todas as road trips que fiz pelos EUA estava acompanhada do meu marido e, apesar de me preocupar com os trâmites, deixei a direção por conta dele e assim fizemos roteiros pela Flórida, Nordeste dos EUA com Canadá e a Highway 1 na Califórnia. Ele gosta de dirigir, então, fiquei muito confortável na minha posição de só observar.

Essa posição de observadora ficou para trás nessa viagem. Nosso carro era alugado pela Mobility. É uma empresa que oferece diversas locadoras na mesma plataforma, então, você pode comparar veículos, preços e serviços para ver qual a melhor opção. Surgiu para ser usada pelas agências de viagem, mas, atualmente, também dá para o consumidor reservar direto pela internet, basta clicar aqui e visitar o site.

Nosso carro era um Seltos da Kia. Na foto, Natalie Soares – Crédito: Sylvia Barreto

Eu não conhecia, eles nos apoiaram nesse projeto, o Mulheres na Viagem, e gostei bastante. A locadora escolhida foi a Avis, uma das líderes do setor nos EUA, que eu havia usado em outras viagens. Então, durante todo nosso trajeto por quatro Estados contávamos não com só o apoio da locadora, mas da Mobility também. Se você nunca alugou carro por lá, acho que vai te dar bastante segurança ter esses dois amparos.

Depois que você desembarca no Hartsfield-Jackson Atlanta Internacional Airport, passa pela imigração e pega suas malas, se vai alugar carro, é hora de pegar o shuttle gratuito que te leva até o Rental Car Center, onde todas as locadoras se concentram. Os ônibus para shuttle ficam no térreo mesmo e tem placas indicando, ficamos lá alguns minutos esperando o ônibus.

O Rental Car Center é um pouco distante do terminal internacional. Chegamos lá, ficamos na fila, apresentamos um cartão de crédito para caução e assinamos os documentos que a atendente nos deu. Importante: nos EUA nossa carteira de motorista é aceita, porém precisa ser a original impressa, e não a versão digital. Não é preciso a Permissão Internacional para Dirigir (PID), porém, a Natalie tem. Eu fui com a CNH brasileira mesmo.

Na hora de escolher o carro considere a quantidade de pessoas, de malas e os terrenos pelos quais irá dirigir – Crédito: Sylvia Barreto

Tínhamos um motorista adicional incluído no aluguel. Então, Natalie era a motorista principal e eu a adicional. Podíamos adicionar nossa terceira amiga em qualquer momento da viagem em uma Avis e pagar uma taxa por dia para que ela também pudesse dirigir. Ela só chegaria mais tarde e teria que assinar, por isso, não poderia ser colocada naquele momento. Isso é algo que vocês devem ficar atentos nas viagens em que mais de uma pessoa irá dirigir: quantos motoristas estão inclusos e qual o valor de motorista adicional por dia.

Algo que também pode mudar o valor do aluguel: devolução em local diferente da retirada. Tem locadora que cobra, outras que não. Precisa ficar de olho. Foi nosso caso, pegamos o carro em Atlanta e devolvemos em Orlando. Isso pode impactar no valor da sua reserva.

Outra dica que eu aproveito para dar aqui é que não deixem ninguém que não esteja indicado na locadora como motorista adicional dirigir. Quando você aluga o carro, o correto é que faça alguns seguros, pelo menos, para o carro, os motoristas e terceiros. Se uma pessoa que não estava autorizada dirigir e sofrer um acidente, o seguro não irá cobrir. Por isso, faça tudo dentro da lei.

A escolha do carro é outro ponto importante na viagem e se for errada pode te atrapalhar muito. O essencial é levar em consideração duas coisas: tamanho do carro e terrenos em que irá dirigir. Vamos começar  pelo tamanho. Nesse quesito é preciso considerar o número de pessoas que ocupará o veículo e a quantidade de malas. Nós estávamos em três, cada uma com uma mala de 23 quilos e uma de mão de 10 quilos, fora bolsas. Neste caso, tínhamos que pensar em um sedã bem grande ou SUV. Eu, particularmente, não gosto de sedan, então, já fico com a SUV só por esse quesito pessoal. Pela questão de terreno, passaríamos só por ruas comuns e rodovias, podia ser um carro mais baixo. Porém, se você for para terrenos mais acidentados e passar por lugares sem asfalto, imprescindível um SUV 4×4.

Para dirigir no Sul dos EUA, só a CNH do Brasil é suficiente. Precisa ser a versão impressa – Crédito: Natalie Soares

Na hora de assinarmos os documentos, a funcionária da Avis também nos ofereceu que a própria locadora completasse o tanque na volta e colocariam o valor no nosso cartão deixado de caução. Só para lembrar, esse cartão precisa estar no nome do motorista principal. Nós não aceitamos essa oferta, preferimos encher o tanque nós mesmas antes de devolver. Um ponto positivo da própria locadora encher o tanque é que você não se preocupa em procurar posto, o negativo é que, às vezes, o valor do combustível é mais caro com a empresa do que na rua.

Com todos os trâmites acertados, é hora de pegar o carro. Te avisam qual é o andar de estacionamento da sua locadora e basta seguir as placas. Em alguns aeroportos, a locadora indica a vaga que seu carro está parado e você só vai e retira. Existe também a possibilidade de indicar que vá até uma área específica com carros da categoria que alugou e escolha isso. Porém, em Atlanta, com a Avis, foi diferente, só nos falaram para encontrar onde ficava a Avis e falar com o atendente.

Primeiro trajeto foi do aeroporto para o nosso hotel, o Holiday Inn Express & Suites Atlanta Downtown – Crédito: Sylvia Barreto

Chegamos ao local e o atendente nos indicou um carro. Alugamos uma SUV e ele nos deu uma da Mitsubishi. Porém, não conseguíamos sincronizar nossos celulares com o sistema dela e queríamos jogar o Google Maps e o Waze lá para irem nos indicando o caminho. Não deu certo, pedimos a troca do carro, ele nos indicou outro, não gostamos muito e fomos para o terceiro. Era um Kia Seltos e adoramos porque logo ele sincronizou tanto com o meu iOS quanto com o Android da Natalie.

Colocamos o endereço do hotel, o Holiday Inn Express & Suites Atlanta Downtown, e partimos. O aeroporto fica a cerca de 15 quilômetros do centro de Atlanta. Apesar de termos conseguido sincronizar os aplicativos de GPS, ainda estava sem o som. Natalie foi dirigindo e eu fui dizendo o caminho. Chegamos bem, o hotel tem estacionamento pago, só deixar na porta e o manobrista pega. Eles pedem seu número de telefone, mandam mensagem e te dão um número do carro, assim, sempre que precisar sair, pode avisar. Confesso que não me dei bem com esse sistema e acaba pedindo na recepção mesmo e esperando.

Atlanta: fácil de conhecer
Vou ser sincera e dizer que se você for conhecer apenas as principais atrações do centro de Atlanta, ter carro não é necessário. Do nosso hotel, podíamos caminhar tranquilamente, coisa de 10 minutos, para atrações bem famosas: World of Coca-Cola, Georgia Aquarium, National Center for Civil and Human Rights, Centennial Olympic Park e Sky View Atlanta (roda-gigante da cidade).

Nos sentimos seguras viajando pelo Sul dos EUA – Crédito: Sylvia Barreto

Todas as atrações mencionadas estão reunidas ao redor do Centennial Olympic Park, que foi construído como parte das melhorias para as Olimpíadas de 1996. Ele também é um ótimo ponto para sentar um pouco e descansar entre uma atração e outra.

Os arredores também estão cheios de restaurantes. Para experimentar os sabores do Sul dos Estados Unidos por ali, o lugar ideal é o All Day Breakfast Club. Sempre cheio de clientes, ele oferece pratos bem sulistas, como o Chicken Waffle, um sanduíche de frango empanado e waffle. Falando assim, parece que não combina, mas, acredite, é uma delícia e o All Day Breakfast Club leva esse prato à perfeição. Outra coisa legal de provar é algum prato com gravy, que é um molho bem típico da região.

Cenas de Atlanta

Não sei você, mas eu amo Coca-Cola bem gelada. Se for o seu caso, aproveite para tomar a bebida em Atlanta. Por lá, é bem comum ter o refrigerante em embalagens de vidro e extremamente gelado, se for no verão, irá agradecer.

Para percorrer as regiões mais centrais de Atlanta sem carro, dá para usar o Streetcar, um tipo de bondinho moderno. Uma passagem única custa US$ 1 e para o dia todo fica US$ 3. Você pode comprar o bilhete com cartão de crédito ou débito em umas máquinas que ficam nos pontos do Streetcar.

Uma área bem emblemática para ser visitada é o bairro de Sweet Auburn, onde existe o Martin Luther King, Jr. National Historical Park. Por ali, além de museu dedicado a ele, tem a primeira igreja na qual pregou, a Ebenezer Baptist Church, seu túmulo e o da mulher no The King Center, a casa onde nasceu e a Fire Station No. 6, primeiro Corpo de Bombeiros de Atlanta a admitir bombeiros negros.

Tem vários murais legais no bairro em que Martin Luther King Jr cresceu

Para quem vai de transporte público partindo do centro, o Streetcar chega bem perto, é preciso completar apenas com cinco minutos de caminhada. De carro, tem um estacionamento ao lado do The King Center.

Outros lugares legais para passar bons momentos se você tem mais tempo na cidade: o Beltline, um parque linear de 35 quilômetros; o Piedmont Park, que serve de cenário para vários filmes de Hollywood; o bairro de Inman Park, com diversos bons restaurantes; o Krog Street Market, um mercado gastronômico diversificado e o Ponce City Market, que abriga lojas e restaurantes descolados.

Primeira igreja em que King pregou – Crédito: Sylvia Barreto

Casa em que King nasceu – Crédito: Sylvia Barreto

Minha primeira vez no volante nos EUA
Em Atlanta foi a primeira vez que peguei o carro para dirigir. Não tem muito segredo, o veículo era automático, assim como o meu no Brasil. Acho que nem tem carro manual para alugar nos EUA, nunca vi. A regra de trânsito mais diferente que achei é a da entrada para direita. No Brasil farol fechado é fechado e pronto. Porém, nos EUA, se você for virar à direita, pode ir mesmo com o farol fechado, mas, claro, sempre vendo se dá. A exceção é quando tem uma placa “No Right Turn on Red” (Não Vire no Vermelho), só que é difícil. E, fique atento, se você for seguir em frente, nunca fique mais à direita da rua porque você vai atrapalhar quem vai virar, e vão querer te matar e ficar buzinando.

Algo que aprendi sobre regras de trânsito dos EUA que não sabia foi sobre lugares com placa de “Pare”, lá, no caso, “Stop”. No Brasil, tudo certo se desaceleramos e vamos indo bem devagar, quase sem parar. Por lá, não, é preciso parar completamente, de verdade. Natalie que me ensinou porque eu estava fazendo como faço no Brasil em várias ocasiões.

Algumas regras de trânsito são diferentes nos EUA, fique atento!

Para quem dirige em São Paulo, em Atlanta é tranquilo. Tem menos carros na rua, o trânsito não é infernal e não tem motoboy o tempo inteiro buzinando para você sair da frente para els passarem. A única coisa que eu acho complicado em qualquer cidade é o sistema de parquímetro, que não é único, muda a cada lugar e você tem que aprender tudo de novo.

Estacionando o carro em Atlanta: a cidade conta com vários estacionamentos pagos e, também, com parquímetros. É preciso ficar atento às placas e ao funcionamento dos parquímetros, que aceitam cartões. Alguns locais oferecem bolsões de estacionamento sem custo, como é o caso do Krog Street Market.

Hora de pegar a estrada para Nashville
Minha amiga Natalia Manczyk encontrou Natalie e eu na nossa primeira tarde em Atlanta. Nós íamos a uma Avis para colocá-la como motorista adicional, mas resolvemos deixar para outro dia e ir dividindo a direção apenas em duas pessoas mesmo.

São cerca de 400 quilômetros, ou 251 milhas, entre Atlanta e Nashville. Aliás, tente se acostumar, por lá, usam milhas e não quilômetros. Eu não me acostumei até hoje e não gosto de milhas, você dirige e dirige e, quando vê, só diminuiu 20 milhas, parece que “não rende”. Claro, na verdade, as distâncias não mudam, apenas nossa percepção.

Os carros alugados já costumam vir com algo semelhante ao “Sem Parar” do Brasil e cobram no teu cartão de crédito depois. Faz anos que eu não vejo um pedágio que aceitava apenas dinheiro nos EUA, antes tinha e era um sufoco. Nesse trecho, sinceramente, não vi pedágio algum. Aliás, na rota toda durante quase duas semanas, acho que não chegamos a pagar nem US$ 20 de pedágio.

Algo bom de fazer o roteiro entre a capital da Georgia e do Tennessee é que Atlanta está em outro fuso horário, uma hora adiantada em relação à Nashville. Então, ganha-se uma hora quando sai de Atlanta e vai para Nashville. Quem faz o caminho contrário, precisa adiantar o relógio em uma hora.

Presta atenção se na sua rota tem mudança de fuso horário – Crédito: Sylvia Barreto

Foi Natalie quem dirigiu o trajeto inteiro entre Atlanta e Nashville, ela não se cansou, então foi indo até chegarmos à capital do Tennessee. Ficamos em um hotel longe do centro da cidade, que nem vou mencionar aqui porque não recomendo. Pelo menos, ele tinha estacionamento incluso e sem custo. Em uma viagem de carro você deve sempre ficar atento a isso nos EUA. Muitos hotéis, principalmente os que ficam em grandes cidades, não incluem estacionamento, como era o caso do nosso hotel em Atlanta. E, a diária para pagar o carro pode ficar entre US$ 20 e US$ 60 dependendo do hotel. Quando são mais afastados dos grandes centros, como era essa de Nashville, costumam incluir.

Saímos do hotel para curtir o centro da cidade ainda estava dia, então, fui dirigindo pela rodovia. Nos primeiros momentos, fiquei com medo, mas, depois, relaxei. Nesse ponto da viagem, já conseguíamos conectar nossos celulares no carro sem problemas e usávamos nossos aplicativos de rotas sincronizados ao veículo, inclusive, o som.

Parar no centro de Nashville também é caro. A cidade tem bolsões de estacionamento com parquímetros e os particulares em prédios. Nos bolsões você precisa ir às máquinas disponíveis, registrar seu carro e pagar. Caso alguém passe para inspecionar e você não tiver feito isso, será guinchado. Nos particulares, tem cancela, liberam um cartão, você entra e paga na saída em máquinas como as de shopping no Brasil. Vai gastar, pelo menos, uns US$ 15 a cada parada.

Nas rodovias dos EUA a unidade adotada é a milha, não quilômetro – Crédito: Natalie Soares

Nashville: a cidade mais vibrante da rota
Eu nem sei o que esperava de Nashville, seja lá o que for, ela superou todas as expectativas e me surpreendeu positivamente. A cidade respira música e tudo é muito vibrante e animado. Se você está pensando que esse lugar não é para você porque não gosta de country, bem, eu também não sou uma grande fã e me apaixonei.

Dia e noite, o som não para na Broadway, também conhecida como Honk Tonk. Ela é cheia de bares com música ao vivo praticamente o tempo inteiro, e eles são chamados de honk tonks, por isso, a rua ficou conhecida por esse nome. Não tem ingresso para entrar e funcionam todos os dias do ano com shows durante a tarde a madrugada adentro. Vale a pena ir visitando vários. A Broadway abriga dezenas deles, um mais animado do que o outros. Alguns têm rooftops com uma bela vista dos arredores.

A rua mais famosa de Nashville: Broadway, também conhecida como Honk Tonk por conta dos bares com música ao vivo – Crédito: Sylvia Barreto

Ali perto, tem mais duas lugares bem emblemáticos para conhecer: Country Music Hall of Fame and Museum, o maior museu da música country que existe, e o Johny Cash Museum. Outro ícone da cidade é o Studio B. Para visitá-lo, o ingresso deve ser comprado combinado como o do Country Music Hall of Fame and Museum, local também do qual saem os ônibus para os tours no Studio B.

E, me senti realmente no Sul dos Estados Unidos, e também como em um filme, quando visitei dois restaurantes. O primeiro deles é o Arnold´s Country Kitchen, aberto em 1982. Com móveis de madeira e um grande balcão no qual servem bebidas e pratos, tem ambiente extremamente típico, assim como a comida. Clássicos do sul como: tomates verdes fritos, hot Chicken tender, brisket defumado, pulled pork e a sobremesa Chess Pie são encontrados por lá e são maravilhosos. Fica na área urbana mesmo, mas a uns 8 minutos de carro do centro.

Comidas típicas e deliciosas do Arnold´s Country Kitchen – Crédito: Sylvia Barreto

Mais na área rural, coisa de uns 20 minutos de carro do centro, fica o Scoreboard Bar & Grill. Se você não se sentir em um filme no Arnold´s, no Scoreboard não terá como escapar. O salão, todo de madeira, tem dois ambientes. Um apenas com mesas e outro com mais mesas, balcões, uma mesa de bilhar e uma bela jukebox. Na área externa, lâmpadas penduradas e mais mesinhas de madeira. Por lá, os pratos também são os típicos sulistas, com muito churrasco defumado.

Scoreboard Bar & Grill – Crédito: Sylvia Barreto

Locomoção e estacionamento em Nashville – Tanto no Arnold´s como no Scoreboard havia local para parar sem cobrança. No Arnold´s até havia um parquímetro, mas, pelo menos quando fomos (uma quinta-feira à noite), e disse que estava liberado para pagar. No centro, como já mencionado, precisará buscar bolsões de estacionamento ou estacionamentos privados. Se você for ficar só mais pela área central de Nashville, consegue resolver tudo de transporte público. Porém, se quer ir para locais mais afastados, é melhor alugar um carro. Outra opção, é pegar Uber, que funciona bem na cidade.

Country Music Hall of Fame and Museum – Crédito: Natalie Soares

Nashville é cheia desses bares em carrinhos – Crédito: Sylvia Barreto

Área externa do Scoreboard Bar & Grill – Crédito: Sylvia Barreto

Na estrada rumo ao Alabama
Pode colocar Sweet Home Alabama para tocar. Não conhece? Procure para entrar no clima. Aliás, esse é até o slogan oficial do turismo do Estado e, quando cruzamos a fronteira do Tennessee com Nashville tem placa com a mesma frase. Foi nesse ponto da viagem também que eu dirigi por horas na estrada pela primeira vez.

Saímos de Nashville no sábado pela manhã, no meu caso, já com uma vontade incrível de voltar. Tenho um amigo também que está vivendo lá e não tive tempo de conhecer sua casa, apenas de vê-lo. Então, já planejo um dia ir com meu marido para visitá-la, ficar nos bares da Broadway até tarde e comer um bom churrasco sulista. Quando você conhecer a cidade, vai entender meu sentimento.

No Alabama, nossa primeira parada foi na única loja do mundo que vende itens de bagagens extraviadas – Crédito: Sylvia Barreto

 

De volta ao tema da estrada, lá fomos nós para nossa próxima cidade: Huntsville. Cerca de 200 quilômetros separam um destino do outro, mas tínhamos uma parada estratégica em Scottsboro (AL), então, nosso trajeto percorrido subiu para 288 quilômetros por conta desse desvio e conto a razão em breve.

Saindo de Nashville, a rodovia estava mais cheia, muitos caminhões, então, fiquei nervosa, agarrada ao volante e tremendo. Conforme ia pegando mais confiança, fui relaxando. Já no Alabama, as estradas estavam bem vazias e amei dirigir por lá.

Abastecendo nos EUA

Já estamos há dias na estrada e eu ainda não contei por aqui como foi nossa experiência abastecendo nos EUA. Como eu disse, eu só fiz road trips sem precisar dirigir por lá e acabava deixando tudo que se referia ao carro nas mãos de quem estava comigo, a maior parte das vezes, meu marido. E abastecer era uma delas.

Eu, particularmente, acho um saco a gente ter que descer do carro e abastecer sozinho e ainda ter que, muitas vezes, entrar na lojinha para pagar. Então, sempre fugia dessa tarefa. Dessa vez, eu não tinha saída e, sejamos sinceros, estava na hora de aprender. Natalie me ensinou e ensinarei aqui.

Pode parecer óbvio, mas o primeiro passo para fazer isso é achar qual botão ou alavanca do carro abre o tanque de combustível. Pode ser uma pequena alavanca do lado esquerdo do banco do motorista, bem embaixo. Achou? Só abrir.

Precisa sair do carro e ver o painel da bomba. No geral, você vai até a loja de conveniência do posto, diz qual bomba está, qual o combustível que precisa e quanto quer colocar ou se quer encher o tanque. Assim, o atendente irá liberar a bomba.

Natalie me ensinando a abastecer o carro – Crédito: Natalia Manczyk

No caso de pagamento com cartão, o atendente vai fazer um lançamento prévio, mas o valor só será debitado mesmo quando você terminar, seja automático ou passando o cartão na bomba. Se você escolheu encher o tanque, a bomba vai travar quando encher e, se escolheu um valor fixo, a bomba vai travar nesse valor ou quando o tanque estiver cheio. Vamos supor que você pediu para colocar US$ 50, porém, você não sabia, e seu tanque encheu com US$ 48, a bomba vai travar. No cartão só vai debitar esse valor e, se você pagou em dinheiro, precisa apenas voltar e pegar o troco. Dentro da conveniência tem controle.

Em alguns postos, se você for pagar com cartão, não precisa entrar na conveniência. Vai fazendo todo o trâmite na máquina mesmo, só que isso varia de posto para posto. Em alguns deles, você ainda ganha um pequeno desconto se for fazer o pagamento dentro da conveniência. E, se não for usar cartão, não se preocupe, aceitam bem o pagamento em dinheiro, sem frescura.

O carro que estávamos, um Kia Seltos, tinha capacidade, mais ou menos, para 13 galões de combustível ou 50 litros. Outra coisa importante para ficar atento é que nos EUA eles anunciam o valor do combustível por galão, e não por litro. Um galão é equivalente a 3,7 litros.

O preço dos combustíveis é exibido nos postos por galão, que dá 3,7 litros – Crédito: Sylvia Barreto

Preço do combustível nos EUA – Sim, o preço da gasolina também aumentou nos EUA. Porém, os EUA do Sul pelos quais passamos têm preços mais baixos se comparados com outros Estados. Vou deixar aqui um site que mostra a média de preços por Estados e muitos do Sul só perdem para o Texas, que está hoje (09/10/2022), enquanto escrevo esse texto, com o valor mais baixo de gasolina. Sai US$ 3.262 o galão. No Alabama, US$ 3.372 o galão e não varia muito nos outros Estados do Sul. Sendo assim, hoje, com US$ 50 eu encheria o tanque do carro que usamos. Com o tanque cheio, a gente rodava uns 300 quilômetros.

No geral, é fácil abastecer, a gente vai pegando o jeito. E foi nesse clima de aprendizado que chegamos ao Alabama e fizemos nossa primeira parada por lá, que, algumas semanas depois, mudaria o rumo das coisas.

Primeiras paradas no Alabama: Scottsboro e Huntsville
Provavelmente, você nunca ouviu falar dessas cidades. Quer dizer, agora, uns meses depois da minha viagem, talvez você já tenha escutado algo sobre Scottsboro e a culpa é totalmente nossa. Se está se perguntando a razão de pararmos nesses lugares, saiba que nada foi ao acaso. Passamos meses planejando esse roteiro com o órgão que nos apoiou, o Travel South, responsável pela divulgação dos Estados do Sul dos EUA no mundo.

O responsável por esse órgão no Brasil apresentou o Alabama para nós e o que ele tem de mais interessante em uma reunião. Ele disse que havia uma lojinha em Scottsboro que era a única no mundo que vendia itens de bagagens extraviadas e que achava isso uma baita curiosidade. Nós três concordamos que esse lugar deveria estar no nosso roteiro. Foi assim que na nossa sugestão de itinerário eu fiz questão de passar por lá num sábado, quando a loja abre, e não em um domingo, quando ela estaria fechada.

E no dia 28 de maio, chegamos à Unclaimed Baggage, a tal da “lojinha”. Tínhamos apenas uma hora por lá antes de partir para o nosso próximo destino e ainda precisaríamos comer algo. Acontece que a loja é gigantesca, tem cerca de 4.000m² e não tínhamos a mínima noção do que nos esperava.

A loja tem estacionamento gratuito. Comecei minhas gravações para Instagram e YouTube no estacionamento mesmo. Estava lotada, era um feriado no país, o Memorial Day. Chegamos e fomos falar com a pessoa que nos indicaram e ela nos mostrou a loja e explicou mais sobre ela. A matéria completa dá para ver aqui.

Unclaimed Baggage – Crédito: Sylvia Barreto

Adianto que uma hora não é suficiente para visitar o lugar. Desde 1970, a Unclaimed Baggage recebe malas extraviadas de companhias aéreas dos EUA. Menos de 1% de todas as bagagens extraviadas param lá, mesmo assim, é muita coisa. Além disso, ela também recebe cargas nunca reclamadas, por isso há coisas novas, e objetos deixados em hotéis e ônibus.

Todos os dias, ao meio-dia, um visitante é sorteado para abrir uma mala pela primeira vez. Nos deixaram fazer isso, Natalia e eu abrimos enquanto Natalie filmava e esse vídeo está no YouTube. Antes de sair correndo para Huntsville, ainda comprei duas bolsas usadas e seis pares novos de meias, gastei menos de US$30.

Passamos pouco mais de uma hora por lá e esse tempo mudou meu Instagram. Semanas depois, fiz um reels da loja. O perfil do Viajar é Simples estava com pouco mais de 12 mil seguidores. Resultado: esse reels viralizou, tem mais de 6 milhões de visualizações e meu Instagram bateu os 60 mil seguidores em algumas semanas.

Acha que foi só isso? Não! Depois da viagem, Natalia também fez reels e uma matéria para o Uol. Eu fiz matéria aqui no site e vídeo para o YouTube. Eis que outros veículos “descobriram” por aqui a loja que existia desde 1970. Que coincidência, não? E foi assim que pautamos um dos maiores site de turismo do Brasil, o Melhores Destinos, que fez uma matéria sobre a loja sem ter ido lá, e o Fantástico, que apresentou a loja como uma descoberta do programa. E assim temos o “estranho caso da loja dos EUA que existe desde 1970, nunca mencionada em grandes veículos, mas, depois que nosso conteúdo viralizou, começou a ser notada”. Curioso, não acham?

Depois dessa repercussão, mais uma vez na vida uma frase que ouvi fez sentido: “na vida, existem dois tipos de pessoas, as que copiam e as que são copiadas, qual você quer ser?”. Fico feliz em saber que estou sempre no grupo das que são copiadas.

U.S. Space & Rocket Center em Huntsville – Crédito: Natalia Manczyk

Voltando para estrada, era hora de sair correndo para Hunstville e vou te contar o porquê da inclusão dessa parada no roteiro: ela abriga um dos centros de visitantes da NASA, o U.S. Space & Rocket Center. Eu já havia visitado dois, o da Flórida e o do Texas, e achei bem interessante conhecer o terceiro. Amo foguetes e tudo relacionado ao espaço e sei que muita gente gosta também.

Saindo de Scottsboro, atrasadas, fomos direto para lá. Para ver com calma, reserve, pelo menos duas horas. É possível ver estações de comando, vários foguetes, como o Saturno V e ônibus espaciais. Uma particularidade do local é que existe um Space Camp. Crianças e adultos podem se hospedar para cursos e até receber um treinamento inspirado no dos astronautas.

Se você gosta de astronomia e foguetes, vale a pena ir ao U.S. Space & Rocket Center – Crédito: Sylvia Barreto

Jardim Botânico de Huntsville – Crédito: Sylvia Barreto

Huntsville é uma cidade pequena, apenas 200 mil habitantes, e recebe cerca de 5 milhões de turistas por ano. Com certeza, seu principal atrativo é o centro de visitantes. Se você passar por lá e resolver dormir, como foi o nosso caso, também vale uma visita ao belo jardim botânico – local – Hunstville Botanical Garden. Além dos jardins, tem esculturas e um borboletário apaixonante.

Alabama: a rota dos direitos civis
O Alabama foi o Estado no qual mais ficamos durante nossa road trip nos EUA. Tinha uma razão: queríamos saber mais sobre os Movimento dos Direitos Civis. Para quem não sabe o que é, foi a luta dos negros pela conquista de direitos nos EUA para dizer de forma bem resumida. É uma história intensa, dolorida e que me fez chegar às lágrimas.

Eu não vou me aprofundar muito na História por aqui porque, como eu disse, cada uma dessas cidades tem ou terá seu próprio texto aqui no site. Então, quem quiser saber mais detalhes, precisa buscar esses textos, vou deixando os links aqui assim que estiverem no ar.

Saímos de Huntsville em uma manhã de domingo direto para Birmingham para ver uma missa na 16th Street Baptist Church. Se você está pensando que somos muito religiosas ou que seguimos a Igreja Batista, não é esse o caso. Por um motivo muito triste, ela entrou para a História: em 1963 grupos de supremacia branca, racistas, colocaram uma bomba no local, que era frequentado por negros. No ataque, quatro meninas morreram.

16th Street Baptist Church, atacada por grupos supremacistas brancos – Crédito: Sylvia Barreto

Atualmente, do outro lado da rua, existe um parque com uma escultura com as quatro meninas. E queríamos assistir uma missa, que é bem emblemática, para entender melhor a história daquele povo. Como em tudo são flores, nos desentendemos no caminho. Eu estava na direção e uma das minhas amigas me pressionava para ir mais rápido e eu não queria, estava confortável na velocidade em que ia. Ela insistia que chegaríamos atrasadas. Não chegamos e, depois de alguns minutos de desconforto entre nós, tudo ficou bem.

A missa é realmente muito bonita. Eu não tenho religião, apesar de ser batizada no catolicismo, mas me comove a fé das pessoas. Além da pregação em si, o coral faz parte desse tipo de missa, tanto que vários cantores dos EUA descobriram seu talento cantando em igrejas.

Depois de sairmos da missa, fomos para o nosso hotel, bem no centro da cidade e histórico. Esse vale a pena de ser mencionado aqui: Hampton Inn & Suites Birmingham-Downtown-Tutwiler. O prédio histórico tem uma fachada muito bonita e os quartos são espaços, com camas confortáveis e bons chuveiros. Se um dia visitar a cidade, indico mesmo que fique lá. O estacionamento tem manobrista, porém, custo adicional. A cidade tem parquímetro, só que, como era domingo, não havia cobrança, então, sempre que precisamos, paramos sossegadas.

Hampton Inn & Suites Birmingham-Downtown-Tutwiler – Crédito: Sylvia Barreto

Depois de deixar tudo no hotel, a representante do órgão de turismo nos encontrou e nos levou para um brunch com um guia local e professor, Barry McNealy. Foi denso. Ele nos deu uma verdadeira aula sobre a segregação racial nos EUA e o Movimento dos Direitos Civis. Foi nessa época que surgiram grupos de supremacia branca no Sul do país, como a Ku Klux Khan.

Para ter uma ideia do cenário que deu início a esses grupos, vamos voltar aos EUA da época da Guerra Civil (1861-1865). Estados do Norte, que representavam o país em si, lutavam contra o Sul, separatista e que usava mão-de-obra de escravos em suas plantations, ou seja, fazendas de monocultura. Com a derrota do Sul em 1865, foi decretada a 13ª Emenda à Constituição que torna os negros pessoas livre, vulgo, a confirmação constitucional da abolição da escravatura que já havia sido determinada por Abraham Lincoln em 1863.

Com a proximidade do Golfo do México, as ostras já começam a fazer parte do cardápio – Crédito: Sylvia Barreto

Restaurante Automatic – Crédito: Sylvia Barreto

Apesar dos Estados do Sul terem que aceitar esse novo cenário, na prática, eles cerceavam os direitos dos negros. Eles eram tratados como cidadãos de segunda classe e não tinha os mesmos direitos que os brancos na sociedade, não votavam, precisavam ceder lugar nos ônibus e tinham dificuldade para serem contratados para trabalhar, só para citar algumas atrocidades.

O que McNealy nos explicou é que o Sul teve que aceitar a 13ª, porém, achou maneiras de aterrorizar os negros. De acordo com nosso guia, se um negro olhasse nos olhos de um branco, isso já dava motivos para ele ser preso. Porém, ele não ficava na delegacia ou penitenciária, era levado para lugares onde trabalhava sem receber como forma de “pagar sua pena”, porém, era apenas uma maquiagem para a escravidão.

Neste contexto, os grupos de supremacia branca surgiram para amedrontar ainda mais os negros. Membros da Ku Klux Klan costumava colocar um crucifixo pegando fogo na casa de seus alvos como forma de aviso e, se ele não se comportasse de acordo com aquilo que o grupo achava adequado, o próximo passo era queimar a casa.

Eu tinha pedido um prato para o brunch e provava uma linguiça bem típica da região, a Conecuh, enquanto ouvia esse tipo de absurdo. Foi difícil segurar as lágrimas e apenas fazer minha refeição como se estivesse tendo uma conversa normal. Não estava, eu estava mal e envergonhada por saber que outras pessoas brancas como eu cometeram tantas atrocidades também nos EUA, além das cometidas no Brasil e em outros lugares do mundo. Não que eu ignorasse esses fatos, só desconhecia alguns detalhes e, ouvir a história ser contada por um negro que teve seus antepassados ameaçados por esses grupos, só fez meu estômago embrulhar.

Vista da cidade do Vulcan Park – Crédito: Sylvia Barreto

E, se você acha que os brancos no Alabama estão sendo conscientizados das atrocidades cometidas no final do século 19 e início do século 20, está enganado. Existe uma lei por lá que proibi que assuntos como esse sejam abordados em escolas e universidades para que os brancos não fiquem constrangidos pelos atos de seus antepassados. Então, gerações estão crescendo sem saber desses fatos, ignorando tudo que os negros passaram e as consequências que esse passado tem até hoje na estrutura da sociedade para dizer o mínimo.

Depois do brunch e da aula que tivemos, fomos conhecer um ponto turístico da cidade, o Vulcan Park and Museum. Ele reúne uma bela vista da cidade, a história industrial do destino e a mais alta estátua de ferro fundido do mundo com 17 metros de altura. Ele fica a alguns minutos do centro da cidade. Depois de visitá-lo, voltamos para a área central e fizemos um tour voltado os Direitos Civis com o Barry McNealy. Se você tem interesse nesse tema e for visitar a cidade, sugiro que o procure, vou deixar um link aqui com o contato dele.

Tínhamos apenas uma noite na cidade, o que foi, realmente, uma pena. Birmingham é uma cidade grande, a maior do Alabama. A população da região metropolitana chega a quase 1 milhão de habitantes. É também conhecida por seus bons e premiados restaurantes. Nós tivemos a oportunidade de jantar em um muito gostoso, com mesinhas na área externa também, além de um ótimo bar com balcão na área interna, é o Automatic Seafood and Oysters. Nessa região do Alabama, como o golfo do México se aproxima, a gastronomia começa a ter bastante frutos do mar e as ostras são as grandes estrelas. Bom, eu não como, mas minhas amigas comeram e recomendam.

Birmingham foi outra cidade da qual eu saí achando que podia ter ficado mais tempo. Recomendo, pelo menos, duas noites por lá. Só que a estrada nos esperava e seguimos nosso caminho até os próximos destinos na manhã de uma segunda-feira.

A famosa ponte de Selma, palco do Bloody Sunday – Crédito: Sylvia Barreto

Selma e Montgomery: Blood Sunday à conquista dos votos

Tínhamos mais dois capítulos na rota dos Direitos Civis. Um deles foi apenas uma rápida passagem. Paramos em Selma, que tem importante papel na luta pela conquista do voto dos negros nos EUA.

Pulamos do ataque à igreja Batista de Birmingham em 1963 para o Domingo Sangrento de 07 de março de 1965 em Selma, que teve a ponte Edmundo Pettus como palco. O ativista John Lewis, de 25 anos, liderou cerca de 600 manifestantes no local buscando o direito básico do voto para os negros, que não foi contemplado na histórica Lei dos Direitos Civis de 1964. O grupo enfrentou uma retaliação brutal de tropas estaduais e as imagens de violência chocaram o país.
Meses antes, em janeiro de 1965, o próprio Martin Luther King Jr para apoiar o registro de eleitores negros em Selma pelo Student Nonviolent Coordinating Committee (SNCC). Na ocasião, ele foi preso e escreveu no The New York Times a seguinte frase: “Esta é Selma, Alabama. Há mais negros na cadeia comigo do que nas listas de votação.”

Em fevereiro de 1965, as tensões raciais cresciam na cidade vizinha de Marion. Soldados estaduais espancaram manifestantes e atiraram em Jimmie Lee Jackson, manifestante afrodescendente de 26 anos que protegia sua mãe, que estava quase sendo atropelada pela polícia.

A ponte cruza o rio Mississippi – Crédito: Sylvia Barreto

Com toda essa tensão, os líderes do movimento pelos direitos civis queriam levar sua causa ao governador do Alabama na época, George Wallace. O plano era sair de Selma e marchar por 80 quilômetros até a capital do Estado, Montgomery, sede do governo do Estado. E, no dia 07 de março, quando a caminhada começaria, aconteceu o ataque conhecido como Bloody Sunday. King não estava na ocasião, ficou em Atlanta e planejava se juntar aos manifestantes mais tarde.

Com o ataque ao grupo, simpatizantes do movimento pelo voto dos negros fizeram protestos em todo os EUA. Muitas pessoas foram até Selma e King tentou uma nova marcha dois dias depois sem sucesso. Ela só iria acontecer depois de uma ordem judicial federal que permitia o protesto. Então, em 21 de março de 1965, a marcha começou de Selma a Montgomery. Quatro dias depois, com 25 mil pessoas reunidas, o grupo chegou ao capitólio.

Com tudo que aconteceu em Selma e a marcha, junto com a opinião pública, foi o suficiente para mobilizar o Congresso para que a Lei do Direito ao Voto fosse aprovada em 06 de agosto de 1965 pelo presidente Lyndon Johnson.

Infelizmente, a ponte que foi palco do domingo sangrento ainda leva o nome de um supremacista branco da Ku Klux Khan: Edmund Pettus. Porém, ela serve de marco para esse movimento.

Capitólio de Montgomery – Crédito: Sylvia Barreto

Sabendo um pouco menos dessa história toda do que eu sei agora, cheguei à Selma com minhas amigas em uma segunda-feira de feriado. A pequena cidade parecia um pouco abandonada. Belas casas típicas se misturavam com outras construções com aspecto de esquecidas. As ruas vazias. Não sei se isso aconteceu por conta do feriado, algumas pessoas com as quais conversamos nos disseram que muita gente foi embora na pior época da pandemia de covid-19. Eu não sei ao certo porque a cidade está assim, fazia muito calor, estacionei o carro perto da ponte em frente a alguns prédios comerciais vazios.

Caminhei até a ponte, ao lado dela fica o National Voting Rights Museum & Institute, porém, estava fechado por conta do feriado. A Edmund Pettus Bridge passa por cima do rio Alabama. A paisagem é bonita, só que eu imagino o Bloody Sunday e meus sentimentos se misturam entre apreciar a beleza do lugar e me entristecer por todo que aconteceu ali.

Só que falta tempo para todos esses sentimentos assentarem dentro de mim, preciso gravar e sair correndo para Montgomery, conhecer a cidade que os manifestantes alcançaram a pé e descobrir mais um pedaço dessa história.

A guia Wanda Battle – Crédito: Sylvia Barreto

 

Em Montgomery as ruas estavam igualmente vazias e o calor parecia mais forte. Capital do Estado, a cidade não tinha o aspecto de abandono de Selma. Fomos direto à rua do Capitólio, que é muito bonito, mas o nosso destino era outro: Dexter Avenue King Memorial Baptist Church. Martin Luther King Jr foi pastor por lá de 1954 a 1960 e ela se tornou histórica por servir de local para reuniões em massa para organizar o famoso boicote aos ônibus de Montgomery, que é uma parte da história que contarei mais adiante.

Agora, quero mostrar aqui a pessoa que encontramos na igreja, a nossa guia, Wanda Battle. Ela, com certeza, é uma das mulheres mais interessantes que já conheci na vida. Nasceu em Montgomery em 1956, quando o boicote aos ônibus borbulhava na cidade. Cresceu na década de 60, quando o movimento pelos Direitos Civis estava em ebulição.

Wanda é uma mulher carismática que faz seus clientes viajarem pela história da comunidade, que se mistura a sua própria vida. Ela faz tours pela cidade e nos recebeu na Dexter Avenue King Memorial Baptist Church, como acredito que ela receba boa parte dos turistas. Você pode ver como contratar Wanda aqui. Durante pouco mais de uma hora, ela contou os principais acontecimentos na cidade que levaram à conquista dos Direitos Civis, do voto e que extinguiu a segregação racial nos ônibus.

Na Dexter Avenue King Memorial Baptist Church os manifestantes para o fim da segregação nos ônibus se reuniam – Crédito: Sylvia Barreto

A situação dos negros nos ônibus até a década de 1950 nos leva à outra mulher, Rosa Parks. Ela foi tão importante que em Montgomery existe um museu só dela. Recomendo muito a visita e é para lá que vamos nos transportar agora. No museu assistimos um vídeo sobre a vida de Rosa e, depois, encontramos a réplica de um ônibus, que remonta a história daquele dia 01º de dezembro de 1955.

Rosa Parks, negra e costureira, voltava para casa de ônibus. Naquela época, os negros podiam usar apenas os últimos assentos do transporte público, sendo as primeiras fileiras reservadas aos brancos por lei. Rosa sentou-se no meio. Porém, o motorista, que era branco, pediu para que ela e outros passageiros levantassem para que alguns brancos se sentassem. Ela se recusou e acabou presa. Como forma de protesto, os negros começaram a boicotar o transporte público de Montgomery e se organizam para caminhar ou pegar carona com amigos e vizinhos.

Nesse período, as pessoas começaram a se organizar na igreja que eu visitei, a Dexter Avenue King Memorial Baptist Church, a qual tinha Martin Luther King Jr como pastor e apoiador do boicote na época.

As companhias de ônibus começaram a perder dinheiro e, para recuperá-lo, aumentaram o valor das passagens e remanejaram algumas linhas para que não passassem nos bairros com mais moradores afrodescendentes. Isso até fortaleceu o movimento, já que as pessoas não conseguiam mais arcar com as tarifas de qualquer maneira.

A população branca de Montgmomery estava revoltada e isso gerou muita violência, com ataques à própria Rosa Parks, que foi solta em 05 de dezembro, e a casa de King bombardeada. Porém, com todas essas retaliações, a situação ganhou cobertura da imprensa dos EUA e até internacional.
Após quase um ano de boicote, em 13 de novembro de 1956, a Suprema Corte dos EUA decidiu que a segregação nos ônibus era inconstitucional. Em 21 de dezembro do mesmo ano, o boicote teve seu fim e os afrodescendentes receberam o direito constitucional de entrar nos ônibus pela porta da frente e sentar em qualquer lugar, sem divisão.

Representação do ônibus no Rosa Parks Museum – Crédito: Sylvia Barreto

Como Rosa Parks passou por muito assédio e recebia ameaças após o boicote. Ela decidiu mudar com seu marido e mãe para Detroit, onde já morava seu irmão. Trabalhou com auxiliar administrativa para o congressista John Conyers Jr até 1988, quando se aposentou. Em 1987, fundou a Rosa and Raymond Parks Institute for Self-Development, que oferece oportunidade de aprendizado e liderança para jovens e idosos. Ao longo de sua vida, ela continuou atuando como defensora dos direitos civis. Morreu aos 92 anos em 2005. Todo esse período histórico e a vida de Rosa Parks pode ser visto no Rosa Parks Museum.

Durante a época do boicote, os manifestantes se organizam para pegar caronas – Crédito: Sylvia Barreto

Como a nossa passagem por Montgomery está cheia de mulheres extraordinárias, não poderia deixar de mencionar Michelle Browder, que também nos encontrou para um de seus tours. Artista e ativista negra, ela dirige a empresa More Than Tours e, ainda, dirige o ônibus em que leva os turistas para conhecer os principais pontos do destino.

Naquela segunda-feira de calor, porém, ela dirigiu até a sede da More Than Tours, onde fica sua galeria de arte. No passeio regular, os turistas visitam alguns pontos e, depois, vão para o local. No nosso caso, fomos direto. No jardim, fica uma escultura que deu reconhecimento ao seu trabalho como como artista e ativista, o “Mothers of Gynecology” (Mães da Ginecologia).

No começo, não entendi muito bem, não conhecia a história por trás da escultura e Michelle explicou. A menos de dois quilômetros do local, existe uma outra estátua, a do médico J. Marion Sims, o chamado “pai da ginecologia moderna”. No século 19, precisamente na década de 1840, ele fazia cirurgias e experimentos em mulheres negras e escravas sem anestesia, nenhum remédio para alívio da dor ou mesmo o consentimento delas. Para ela, a estátua daquele homem é um gatilho, sente raiva quando a vê.

Escultura Mothers of Gynecology de Michelle Browder – Crédito: Sylvia Barreto

Sims tinha uma estátua também no Central Park, em Nova York. Porém, o debate de seus métodos levou à retirada dela em 2018. No Alabama, porém, parece que ela vai continuar onde está já que, em 2017, a governadora Kay Ivey assinou uma lei que proíbe a remoção de monumentos que estejam em propriedade pública por mais de 40 anos. A estátua de Sim foi colocada em 1939.

Para lidar com seus sentimentos e trazer à tona a verdadeira história, Michelle criou a escultura que reúne Anarcha, Lucy e Betsey, três das mulheres que passaram pelos experimentos de Sims. Só Anarcha sofreu mais de 30 cirurgias e tem um buraco no lugar do útero. Sua altura é de 4,5 metros, quase o dobro do monumento de Sims.

Segundo Michelle, ela fez o monumento para ninguém nunca mais desprezar aquelas mulheres e reconhecer e amplificar suas vozes, que passaram por diversos experimentos que levaram ao avanço atual da ginecologia. E, atualmente, a escultura pode ser vista no número 17 da Mildred ST, junto com outras obras de Michelle.

Michelle Browder em sua galeria de arte – Crédito: Sylvia Barreto

Depois de todas essas informações intensas, voltamos ao nosso hotel, o Hampton Inn & Suites – Downtown de Montgomery. Era muito bem localizado e com quartos espaçosos. Se você visitar a cidade um dia, recomendo. O estacionamento tem custo adicional. Ele fica a poucos passos do Rosa Parks Museum e tem várias restaurantes ao redor.

Porém, nosso jantar era longe do centro, precisando a 18 quilômetros de lá, no Dreamland Barbecue. Explico: como era feriado, quase tudo estava fechado. Tem um Dreamland bem pertinho do hotel, só que não estava aberto, então, fomos nesse ícone do churrasco sulista no meio da rodovia instalado no estacionamento de um Walmart.

Com decoração e clima bem típicos de um restaurante sulista de churrasco, ele oferece delícias como costelas, linguiças e frango frito. Valeu a pena dirigir até lá, as carnes desmancham na boa e aos acompanhamentos, como mac´n´cheese e salada de batatas são perfeitos.

Comida bem gostosa e sulista no Dreamland Barbecue – Crédito: Sylvia Barreto

Segurança nas estradas dos EUA para mulheres
Preciso contar que não lembro ao certo onde isso aconteceu, talvez tenha sido depois que saímos de Montgomery ou outro dia, mas o local mesmo não muda muito o fato. Ao longo de todos esses dias dirigindo, parando em diversos lugares e abastecendo o carro sozinhas, além dos vários passeios que fizemos, não nos sentimos ameaçadas por sermos mulheres e nem tememos por nossa segurança em momento algum.

Sinto dizer que o mesmo não acontece, pelo menos comigo, em diversos lugares pelos quais passos, inclusive no Brasil. Em São Paulo, na minha cidade, fora a insegurança que eu sinto por ser mulher quando ando sozinha na rua à noite, em qualquer horário que dirijo, me sinto acuada pela violência.

No Sul dos EUA me senti segura como turista e como mulher. E algo bem emblemático que aconteceu foi um dia que nos perdemos um pouco. Saímos da rodovia principal e entramos em uma estrada menos movimentada, acho que estávamos procurando um posto. Pois bem nessa estrada havia um acostamento no qual podíamos parar e achei melhor estacionar por uns minutos para ver os caminhos possíveis.

Nos sentimos seguras nas rodovias do Sul dos EUA – Crédito: Sylvia Barreto

Era uma manhã de sol, o lugar era tranquilo e nós não estávamos com medo. Nisso, um carro parou e a mulher que o dirigia fez sinal para saber se estávamos bem, se tinha acontecido algo. Dissemos que estava tudo bem, ela seguiu e voltamos a olhar o celular. Nisso, um segundo carro para, dessa vez, com um homem, ele também parou e quis saber se estava tudo bem.

Não sei se talvez nos EUA seja mais difícil os carros pararem na estrada e a gente não sabe disso, mas achamos muito bonita essa atitude de pararem para ver se estávamos bem. Não foi algo sexista, já que uma mulher e um homem desconhecidos pararam em momentos diferentes. Foi algo de cuidar do outro mesmo. Afinal, era um carro parado no acostamento em uma estrada bem vazia.

E, não pense que é difícil achar postos em estradas. Não é, sempre tem avisos, aliás, de restaurantes também. Existem placas com a saída que você deve pegar para ir até um posto ou restaurante, porém, depois que você pega a saída, às vezes demora um pouco para avistar o lugar que quer ir. Por isso, às vezes achávamos que estávamos no caminho errado.

Os desfiles de Mardi Gras como conhecemos hoje começou em Mobile – Crédito: Sylvia Barreto

 

Mobile: onde o Mardi Gras teve início
Saímos de Montgomery e rodamos quase 300 quilômetros até alcançar a região litorânea de Mobile. Mudamos de ares, levamos o aprendizado dos Direitos Civis na bagagem, mas, em Mobile, nosso foca era mais a história da cidade e sua aptidão para a festa com o Mardi Gras.

Sei que New Orleans tem a fama pela festa carnavalesca, mas ela nasceu lá em Mobile, Alabama ainda. Antes de me aprofundar nesse assunto, quero tratar de outra assunto importante por lá: ostras. Sim, já estamos no Golfo do México e não comer essa iguaria por lá é quase um sacrilégio e até eu que não gosto, provei.
Nossa primeira parada foi para o almoço, no restaurante tradicional Wintzell’s Oyster House. Na região as ostras podem ser servidas de uma maneira bem diferente: gratinadas com coberturas como japaleño e bacon. Para o meu trabalho jornalístico, decidi provar. Resultado: não gostei. Só que eu já não curto ostras mesmo, então deixo vocês com a opinião das minhas amigas, que gostaram. Para prato principal eu fui de camarões empanados mesmo.

Um prato típico da região: ostras gratinadas – Crédito: Sylvia Barreto

Depois do almoço, fomos deixar nossa bagagem no hotel, o Hampton by Hilton no centro da cidade. Só de dar uma volta pelos quarteirões dá para perceber a semelhança arquitetônica com New Orleans. As ruas são cheias daquelas casas com varandas de ferro fundido, ao estilo “townhouse americano”. E, sabe de onde veio esse ferro todo? Boa parte de Birmingham, que deixamos há alguns quilômetros.

Visitei dois lugares emblemáticos no centro de Mobile. Um deles é o History Museum of Mobile, que também inclui o Colonial Fort Condé. A cidade foi fundada pelos franceses e esse forte construído por eles em 1723. Como a cidade foi dominada por diferentes nações, ele recebeu alguns nomes diferentes ao longo dos anos. No século 19, ele era visto como obsoleto, já que o destino não precisava mais ser defendido de invasores e foi demolido em 1823.

Casa estilo townhouse americano – Crédito: Sylvia Barreto

Pulando para o ano de 1966, com a construção do túnel George Wallace para facilitar o trânsito na Interstate 10, a cidade contratou arqueólogos para remover todos os artefatos históricos da área. Milhares de artefatos dos séculos 18 e 19 foram achados, incluindo parte da muralha original do forte. Sendo assim, como parte da celebração do bicentenário da nação, parte dele foi reconstruído e em uma escala de quatro quintos do original e inaugurado em 1976 como parte da celebração do bicentenário da nação.

Colonial Fort Condé – Crédito: Natalie Soares

Toda área ao redor do Colonial Fort Condé foi revitalizada. E, por ali, o Mardi Gras é lembrado todos os dias, mas que só foi inaugurado em 2016. Impossível não notar as estátuas do Mardi Gras Park. Ele reúne esculturas dos principais personagens encontrados nessa celebração. Como a Queen of Magma, The Trumpeter, Joe Cain, Queen of Carnival, dentre outros.

E, por falar em Mardi Gras, o modo como se comemora a festa, que seria a mesma que o nosso Carnaval, começou em Mobile, e não em New Orleans. Aliás, a cidade partilha de várias coisas em comum com a vizinha, a começar que, antes, Mobile também fazia parte do Estado de Louisiana, como New Orleans. Além disso, ambas foram fundadas por franceses, por isso, há costumes e arquiteturas antigas parecidas.

USS Alabama Battleship Memorial Park – Crédito; Natalia Manczyk

Seguindo o projeto arqueológico, a Comissão de Desenvolvimento Histórico Móvel recomendou a construção de uma réplica muito menor do forte no topo de uma parte do local original. A cidade e uma associação de poupança e empréstimo financiaram a construção do forte, parcialmente em reconhecimento ao crescente desejo de turismo e desenvolvimento histórico em um centro em declínio. O esforço envolveu a restauração e revitalização de vários quarteirões do bairro histórico da Church Street East, próximo ao forte; uma réplica de aproximadamente um terço do tamanho do original e construída em uma escala de quatro quintos.

Mobile já está no Golfo do México – Crédito: Sylvia Barreto

Mardi Gras Park com personagens típicos da festa – Crédito: Sylvia Barreto

Na única noite que tivemos em Mobile, tivemos a oportunidade de jantar em um dos melhores restaurantes da viagem, o The Noble South. O cardápio dele costuma mudar um pouco com a estação, mas, se passar por lá, não deixe de provar um dos melhores camarões que eu já comi na vida. É uma entrada chamada de Pickeld Shrimp, camarões em conserva, como se fosse picles. Descobri que é uma iguaria típica do Sul dos EUA, porém, só comemos no The Noble South.

No dia seguinte, antes de ir embora, ainda nos despedimos da cidade passando em um local tradicional de café da manhã com pratos enormes, o Bob´s Downtown Restaurant. É daqueles lugares com combinados com pães, ovos, bacon e outras delícias. Não demoramos muito porque 250 quilômetros de estrada nos esperavam até New Orleans.

Entradas do Noble South – Crédito: Sylvia Barreto

Noble South: um dos melhores restaurantes da viagem – Crédito: Sylvia Barreto

New Orleans: única e emblemática
Talvez eu seja um pouco infantil e fútil – ou a indústria do entretenimento poderosa – e minhas grandes referências de New Orleans eram até minutos antes da minha chegada o filme da Disney “A Princesa e o Sapo” e um casal do programa “90 Dias para Casar” que mora na cidade. Ah, tudo bem, claro que eu sei sobre o furacão Katrina que devastou o local e que lá é o berço do jazz, mas preciso confessar que a Tiana e o jacaré Louis dançando é a primeira coisa que me vinha à cabeça quando falavam da cidade.

Natalie e Natalia já conheciam New Orleans e suponho que, mesmo antes de irem, elas não tinham as mesmas referências fúteis que eu. Esqueci de falar que também lembrava do vodu, principalmente das cenas do filme A Chave Mestra e do seriado American Horror Story com a bela e poderosa Marie Laveau. Sim, às vezes eu tenho referências estranhas dos destinos. Você também?

New Orleans e sua bela arquitetura – Crédito: Natalia Manczyk

Com a nossa correria de quem precisa percorrer centenas de quilômetros em pouco tempo por cidades desconhecidas, chegamos em cima da hora em New Orleans para nosso primeiro compromisso. Uma amiga brasileira que estava morando nos EUA visitou a cidade dias antes e avisou: cuidado com as ruas e estradas por lá, estão ruins.

Acho que minha amiga ficou muito acostumada com as rodovias perfeitas do Texas, onde morava, e esqueceu como é no Brasil. Para quem dirige nas ruas esburacadas de São Paulo e já viajou boa parte do país, as ruas de New Orleans não surpreendem. Tem uns buracos? Sim, nada que eu não encontre no meu bairro. Se comparar com Atlanta, por exemplo, é pior em termos de pavimentação de vias, só que nada muito relevante.

Já aviso que foi o lugar que tivemos mais dificuldade para estacionar e achar bons preços de estacionamento no centro. Realmente, não indico que ande de carro nessa parte da cidade. Além disso, faz muito calor, paramos o carro em local descoberto e na volta estava um verdadeiro forno.

Depois de toda tensão para parar o carro em uma cidade que eu não conhecia, pude relaxar e curtir a beleza do French Quarter de New Orleans. Tiana não estava por lá, mas a beleza arquitetônica, o povo receptivo e o calor do Sul da primavera nos receberam animados.

Fizemos um tour gastronômico caminhando. Sinceramente, não gostei muito porque esperava que visitaríamos locais mais escondidos, daqueles que só quem conhece bem a cidade já foi. Pelo contrário, fomos apenas aos lugares mais famosos e acho que isso é fácil fazer sozinho, ou pelo menos, para o perfil do nosso grupo. Porém, destaco aqui um local que passei e achei interessante: a muffuletta. Trata-se de um sanduíche italiano inventado em New Orleans que leva salame e presunto, além de queijo provolone, azeite de oliva e um pão redondo. Durante o tour, provamos um dentro do Franch Market no Alberto´s Cheese & Wine Bristo. É um sanduíche bem grande, então, eles costumam vender metade ou ¼.

Muffuletta – Crédito: Sylvia Barreto

Depois do tour e de conhecer um pedacinho da cidade, fomos para nosso hotel: Hyatt House New Orleans/ Downtown. O quarto era bem novo e espaçoso, assim como as instalações comuns. O hotel fica em um complexo com escritórios e tem uma passarela com acesso a um estacionamento caminhando. Então, é preciso deixar o carro lá e acessar o hotel por esse caminho. Tem custo adicional que pode ser por horas ou a cada 24 horas.

À noite, precisávamos voltar para a área mais central da cidade, então, fomos de Uber para não ter que pagar estacionamento em todo lugar. Fomos fazer um passeio de barco pelo Rio Mississippi com a Steamboat Company.

Entardecer no Rio Mississippi visto do barco – Crédito: Sylvia Barreto

Passeio pode ser com ou sem jantar – Crédito: Natalia Manczyk

Acho esse tipo de passeio imperdível na cidade. O barco a vapor é lindo e um clássico, a vista da cidade é outra a partir do rio e, para completar, o jazz rola solto. Achei a cara de New Orleans. Percebi que isso era algo no meu inconsciente sobre a cidade. O trajeto dura duas horas, como fiz no começo da noite e era junho, vi o pôr do sol navegando com a banda de jazz tocando ao fundo Vale muito a pena.

De barco a vapor pelo Rio Mississippi – Crédito: Natalie Soares

Minha única crítica ao passeio de barco é para o jantar. Você pode optar com ou sem a refeição e o meu incluía, mas escolha apenas pelo passeio. Não é nada muito típico e nem sensacional, então, com o valor que economiza, usa para jantar na cidade. Uma dica adicional: passe repelente, costuma ter uns insetos chatos.

No nosso segundo dia em New Orleans foi hora de pegar estrada para um passeio em outra cidade para visitar uma plantation, que é uma grande fazenda de monocultura que, no passado, usava o trabalho escravo. Como um de nossos focos era produzir conteúdo sobre os Direitos Civis, achamos imprescindível ver as condições que os escravos viviam e as mudanças com o fim da escravatura.

Dirigimos cerca de 100 quilômetros por belas paisagens até alcançarmos a Oak Alley Plantation. A propriedade oferece tours pela casa principal, bem ao estilo E o Vento Levou, com horário agendado. Nela, moravam os donos. É uma bela propriedade com vista para um bosque cheio de carvalhos. No outro extremo, as pequenas moradias dos negros escravizados que abriga The Slavery Exhibit.

Oak Alley – Crédito: Natalie Soares

De 1836 a 1861, 220 negros foram escravizadas em Oak Alley. A principal atividade por ali era o cultivo de cana-de-açúcar, eles trabalhavam nas plantações e em todos os outros afazeres da fazenda, como os cuidados com a casa principal. Na mostra, o visitante pode ter ideia de como era a vida por ali na época da escravidão com exibição desde objetos usados no cotidiano até aqueles que serviam para prender e torturar os negros, assim como os utilizados no Brasil.

É contrastante: um lugar lindo com uma mansão e os negros sendo maltratados e vivendo em casas minúsculas com acesso mínimo ao essencial para viver. Não há muita diferença com as fazendas brasileiras da época da escravidão com a casa-grande e a senzala.

A Oak Alley é longe de restaurantes, melhor comer por lá mesmo. Nós chegamos cedo, então, quando a visita acabou, estávamos com fome e almoçamos no Oak Alley Plantation Restaurant & Inn com a típica comida cajun. Como algo bem típico da região e que você, definitivamente, precisa provar, um po´boy sandwich. Ele pode ter recheios diversos, e são três opções por lá, o meu foi de roast beef e estava delicioso. Também havia a opção com camarão, que é bem famosa.

Casa principal da Oak Alley – Crédito: Sylvia Barreto

Casa em que viviam os negros escravizados – Crédito: Sylvia Barreto

Voltamos à cidade e no começo da noite fomos para uma atração que foge um pouco do roteiro de quem visita New Orleans pela primeira vez: aula de culinária com pratos típicos de lá. Aviso que eu amo comer, cozinhar em si, não é meu forte. Para completar, claro, a aula seria em inglês e fiquei com medo de não entender as coisas mais específicas.

Minha sorte é que Natalie gosta de cozinhar e estava empolgada. Natália, por sua vez, não tem intimidade alguma com a cozinha. Nesse cenário, fomos as três para a aula na New Orleans School of Cooking no coração da cidade. Havia outros alunos, não era uma aula só para nós, porém, éramos a única que o inglês não era o primeiro idioma.

Coloca avental, enche a taça de vinho e vamos ao fogão. Originalmente, ficam duas pessoas em cada fogão, mas nos deixaram ficar em três. O menu? Chicken and Andouille Gumbo (uma sopa de frango e um tipo de linguiça semelhante à calabresa); New Orleans Jambalaya (um prato que mistura arroz, linguiça, frango e camarão) e bananas foster (basicamente, banana flambada).

Adorei aprender alguns clássicos da comida da Louisiana

Um ótimo trio

O que eu gostei é que os pratos eram todos bem típicos e nós que temperaríamos, assim, podíamos controlar a pimenta, que eu não gosto muito. Aliás, esse era um temor para mim de uma viagem ao Sul dos EUA com a comida cajun, de ser muito apimentada. Pelo menos em todos os lugares que comi, não achei nada forte neste quesito.

E lá fomos nós por pelo menos uma hora de aula cozinhando, em inglês e, para minha surpresa, deu tudo certo e os pratos ficaram maravilhosos. Aliás, gumbo é algo bem típico na região e achei uma sopa deliciosa. Ainda não tinha provado jambalaya e amei. Poderíamos comer qualquer um deles em diversos restaurantes, mas a experiência de fazê-los foi ótima. Se você não quiser ou não tiver a oportunidade de fazer uma aula, certifique-se de provar esses dois pratos em New Orleans pelo menos.

Como a escola de gastronomia fica no French Quarter, fomos caminhando até uma das ruas mais famosas de New Orleans, a Bourbon Street. Ela é exatamente como vi na TV algumas vezes: cheia de bares, de gente, de despedidas de solteiro e de clubs de strip-tease. Tínhamos um endereço certo por lá: o número 733. No local funciona o Fritzel´s Jazz Club. É a casa de jazz mais antiga de New Orleans ainda funcionando. Abriu em 1969 e está instalado em um prédio de 1831.

Bourbon Street – Crédito: Sylvia Barreto

 

Não precisa pagar para entrar no Fritzel´s Jazz Club, porém, para ficar ouvindo o ótimo som ao vivo que rola por lá, é preciso pedir uma bebida. Eu estava extremamente cansada e no outro dia enfrentaríamos 650 quilômetros de estrada, então, foi uma pena, mas fui embora cedo. Gostaria muito de ficar horas por lá. O restante da rua é mais para quem quer bagunça e beber muito, o Fritzel´s é para ouvir boa música e sentir o verdadeiro espírito de New Orleans.

Já passava das 22h00 horas, o que é cedo para começar a noite em New Orleans, mas tarde para quem ainda tem muita estrada pela frente, quando pegamos um Uber para ir para o hotel. Natália desistiu de voltar, queria mais jazz e foi a Freemont Street, que concentra vários bares que tocam esse estilo musical.
Natalie e eu fomos para a lavanderia do hotel lavar roupas. Nossa viagem pelo Sul dos EUA estava terminando, mas, quando devolvêssemos o carro em Orlando em dois dias, iríamos passar uns dias no maior evento de turismo dos EUA, a IPW. Depois, eu ainda ficaria mais 10 dias em Orlando, Natália iria para outros destinos da Flórida e Natalie para Nova York, ou seja, precisávamos de roupas limpas.

Fritzel´s Jazz Club – Crédito: Sylvia Barreto

Quando acordei naquela sexta-feira de junho, dia 03 para ser mais exata, não fazia a mínima ideia de como meu dia ia terminar de uma maneira completamente inesperada. Enquanto eu ignorava um fator extremamente importante, carregamos o carro para deixar a cidade. Não sem antes comer uma de suas iguarias, o beignet.

Se você andar pelo Franch Quarter vai ver o tradicional Cafe du Monde e muitas pessoas se deliciando com o beignet. Nós resolvemos ir a outra loja do Café du Monde na nossa saída da cidade, no New Orleans City Park. É um parque mesmo com vaga gratuita para o carro. A filial é menos cheia do que a do centro.
Natalie e Natália falaram que era mais ou menos parecido com o nosso bolinho de chuva. Os norte-americanos dizem que é um donut sem o furinho. Não é nada disso. Achei um doce totalmente único, extremamente macio. Surgiu na cidade com os colonizadores franceses no século 18. É uma massa frita, envolta depois em açúcar de confeiteiro e perfeita para comer tomando um café com leite e chocolate quente. Só cuidado que é açúcar para todo lado.

Depois de comer sozinha três beignet, que é um exagero, pegamos a estrada. Era o trecho mais longo da viagem, 620 quilômetros até a capital da Flórida: Tallahassee, Flórida, EUA. Só iríamos dormir por lá para, no dia seguinte, seguirmos até Orlando e devolver o carro. A viagem passou e não cadastramos Natália como motorista adicional, então, apenas Natalie e eu dividíamos a direção.

Cafe du Monde do Centro – Crédito; Sylvia Barreto

Beignet: não saia de New Orleans sem provar – Crédito: Sylvia Barreto

Na estrada para a Flórida, a grande surpresa
Aquele dia eu estava completamente cansada, além de preocupada. Minha menstruação estava atrasada há três dias e as meninas diziam que era porque estávamos sem rotina, numa correria doida e eu ficava apreensiva para tudo dar certo, então, devia ser por essas razões o atraso. Algo em mim dizia que não.
Sou casada, meu plano era tentar engravidar apenas no final de 2022 ou começo de 2023. Tenho 38 anos e os médicos dizem que nessa idade não é tão fácil engravidar. Não usei nenhum método contraceptivo um dia naquele ciclo, por isso, minha preocupação. Por outro lado, por conta da minha idade, achei que não seria fácil acontecer.

Começou a chover muito em um momento do trajeto e eu tenho medo de dirigir nessas condições na estrada. Natalie estava na direção e foi ótima. Só que a chuva nos atrasou e tínhamos um jantar com duas amigas do turismo. Nem passamos no nosso hotel, fomos direto encontrá-las.

O jantar terminou lá pelas 22h30 e as meninas disseram que se eu tinha dúvidas se estava grávida ou não era melhor comprar um teste na farmácia. Paramos em uma CVS, peguei um teste e fomos para nosso hotel.

Sabe aqueles motéis de estrada dos EUA? Nosso hotel era assim, acho que só um pouco mais novo e bonito do que aqueles clássicos que vemos nos filmes. Só que havia apenas uma pessoa no atendimento. Demorou para ser atendida e meu xixi estava quase saindo. Sério, como fomos parar nesse assunto em um texto de viagem?

Teste de gravidez na CVS de Tallahassee

Depois de tudo acertado, chave na mão, fomos pelo estacionamento de carro procurando nosso prédio, que era um dos últimos. Saí correndo, deixei as meninas no carro pegando as malas, mal vi o quarto e fui direto para a banheira. Fiz xixi num copinho, enfiei o teste lá e chamei meu marido em uma ligação de vídeo. Era quase meia-noite na Flórida. Sabe aquela uma hora que ganhamos com o fuso horário quando saímos de Atlanta e fomos para Nashville? Pois bem, acabamos de perder porque Tallahassee está uma hora à frente de New Orleans.

Logo eu vi que as duas linhas ficaram rosa, e a caixa indicava que isso era positivo para gravidez. Esperei os minutos indicados e era isso mesmo: grávida. Meu marido e eu ficamos em choque. Nosso primeiro filho descoberto em um motel de Tallahassee e os dois separados. Sempre achei que essa descoberta seria feita no banheiro da minha suíte junto com ele. Só que eu esqueci que sou uma viajante profissional e a maneira que eu considerava “normal” deve ser a mais improvável para a vida que eu levo.

Saí do banheiro ainda em choque e contei para as meninas. Elas amaram. Natália chorou e Natalie já se ofereceu para ser madrinha. Eu nem sabia o que fazer. Só pensava que eu ainda tinha quase duas semanas intensas nos EUA, não tinha me preparado, estava tomando bebidas alcoólicas quase todos os dias e me senti a mãe mais irresponsável do mundo.

Nosso quarto era para ter três camas e só tinha duas. As meninas dividiram uma e quiseram me dar espaço para eu entender tudo que estava acontecendo ficando sozinha na cama. Achei muito bonito da parte delas. Eu dormi pouco e devo ter roncado muito.
Acordei no dia seguinte me sentindo bem, mas ainda em choque. Ainda tínhamos mais de 400 quilômetros para dirigir até Orlando. Fui na direção nas primeiras horas, depois, não consegui mais, meus olhos fechavam, eu só queria dormir. Natalie assumiu o volante e assim chegamos ao nosso destino de devolução do carro: Orlando.

Foram mais momentos de tensão. Tínhamos que pegar nossas credenciais da IPW antes de devolver o carro. Pegamos, saímos correndo e fomos direto para o posto abastecer. A gente marcou para devolver na Avis do nosso hotel mesmo, o Universal´s Aventura Hotel. Tem um espaço no estacionamento dedicado à locadora, muito fácil.

Assim, terminamos nossa rota de quase 3.000 quilômetros pelos EUA em três mulheres e um bebê recém-descoberto. Quando planejávamos essa viagem, eu achei que não conseguiria, estava até desanimada. No fim, percebi que o que eu fiz só com outras mulheres e grávida em outro país, muito homem não faz nem em sua terra natal. O projeto Mulheres na Viagem, que nasceu com a ideia de incentivar mais mulheres a viajarem sozinhas ou com amigas, só mostrou que nós, realmente, podemos fazer tudo.

Apenas um resumo: valeu a pena!

Um final nem tão feliz
Não foi fácil ficar mais uns dez dias nos EUA longe do meu marido e grávida. Estava muito cansada, o calor era intenso e tinha muito trabalho. Na volta, ainda por cima, perdi uma conexão por atraso do voo anterior e passei bastante nervoso.

Tinha poucos dias no Brasil antes da próxima viagem, acho que só cinco. Aproveitei para fazer exames, ir ao médico e descansar. Embarque novamente para uma viagem de uma semana pela ilha caribenha de St. Martin.

Eu me sentia bem, nada de enjoo, cabelos lindos, pele perfeita. Parece que só as coisas boas da gravidez aconteciam comigo. Até que eu voltei para o Brasil e fui fazer uma nova ultrassonografia e na hora percebi algo errado: o embrião não evoluiu. Aquele meu bebê que já teria passado por vários países antes de nascer, não nasceria.

Meu marido e eu acreditamos que tudo acontece por uma razão e no tempo certo. Apesar de ser triste o que aconteceu, fico agradecida por ter sido bem no começo e eu nem sabia o sexo ainda, de certo modo, tudo era um pouco irreal nesse princípio. Com certeza, essa gravidez e a descoberta me fez ver que eu posso muito mais do que imaginava e todas as mulheres também. Às vezes a gente não acha mesmo pode fazer uma coisa até ver que era capaz de muito mais. E que venha outro bebê no tempo que for.

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Fontes utilizadas além do site oficial de cada destino:

http://encyclopediaofalabama.org/article/h-3935

History.com

Mundoeducacao.uol.com.br

www.britannica.comwww.montgomeryadvertiser.com/

www.washingtonpost.com

www.neworleans.com

*O Viajar é Simples viajou com apoio do Travel South e seus parceiros, como a Mobility

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